quinta-feira, janeiro 25, 2007

Copacabana

Segunda quase terça
fito meus pés de calçadas inóspitas:
latejam buzinas ponteiros, entranhas
que choram pois trocam verões
por noites céus encobertos
de cinzas - etérea eterna angústia, palidez
dos vazios olhares, olheiras
de medo aziadas retinas me
encaram: as minhas doentes
insones febris, refletidas nas
tuas -- doentes, insones
febris.

sexta-feira, janeiro 19, 2007

Dois

Arrisco todo o tempo do mundo, não tenhamos pressa. Ele diz que sente - ele jura - que só dura vinte e cinco, eu otimista, suponho quarenta e dois. Temos, portanto, calculo com as mãos: um dois três anos restantes. É tempo muito para colecionar outonos, admitir ilusões, tatear as terminações de cada nervo, cabelos, omoplatas, sinais nas costas. Combinaríamos escalas de cores, minutos, espelhos foscos e feixes de luz. Ou então, há ainda tempo que obrigue nossas unhas a arranhar paredes, muros de casa, até que arranquem em brasa as dobradiças das janelas, asfixiadas: obscuro carnaval por dentro, carnaval de luz lá fora, máscaras, segredos mil. É cedo. Quem dirá se já, agora, caberia a nós dois pensar em números? Quanto mais nestes poucos, aqueles, que não se contam nos dedos.

sábado, janeiro 13, 2007

Ciranda entre tangos

Me desculpe o entusiasmo, mas não é todo dia que encontro alguém assim tão medido cabido perfeito, e agora já bem sei que não adianta fingir, fugir desse verão tão repleto de terças-feiras, fumaça, e meninos de rua que você não existe nem olha pra mim.

À flor da pele o tal fulano flautista ilustre, experimenta cirandas e agudos para as tantas outras pernas que floreiam em roda, imundo o piso que gruda nos pés. Mesmo no salão cheio estou um pouco sozinha, ensaio a cara de indiferença e já de prontidão aviso que não sei dançar: dois-pra-lá dois-pra-cá, tem que soltar mais os ombros, segue meus passos, deixa que eu te levo. Prefiro sambar assim de longe, finge que não me toca, desvio o olhar, pode provocar que eu sou forte e madura e segura de si. Temos muito em comum, ele diz, parece estranho mas, com licença, posso te beijar?

É claro que prudente seria pedir logo um táxi, sacar a chave de casa, bater a porta do quarto de persianas, lençóis, abajur. Ligar o ar-condicionado, dormir de maquiagem, exausta vazia e um pouco bêbada, como se nada nem ninguém pudesse ter tido a mínima ínfima chance de se aproximar um dia da minha heróica distância particular.

Ao invés disso, pega meu telefone, recito afobada os oito números, repito para ter certeza, pode ser que ele ligue, quem sabe marcamos uma praia, vamos ao teatro ao cinema à ópera ao raio que o parta; ou então não liga nunca mais, pediu por capricho, apenas solícito, estava sendo bem-educado.

Esquece, eu sou só uma trepada em potencial, sou qualquer uma, sou fácil demais. Quando precisar, me dá um toque que eu caio direitinho. Pensa que me engana? Cantarola um tango antigo, tem tristezas, nostalgias da Argentina, ele parece tão sensível... Olha pra mim, eu pareço entusiasmada? Não, não fala. Me abraça outra vez daquele jeito. Espera, eu mal te conheço. Pensando bem, tenho sono, já são cinco da manhã: você pode me deixar na Gávea?

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