quarta-feira, agosto 02, 2006

Carta inventada a um meio amor

Com a ponta dos dedos, tateio de um extremo liso da superfície da chave ao outro, grosseiramente sinuoso. Engraçada essa tua mania de extremos, oito ou oitenta, me faz fazer juras de amor, me fala de posse. Meu bem, talvez você não me entenda, mas quero que você se vá, eu me vou por enquanto levando até ser digno de ti. Preciso de mim, entende? Me perdi, não consigo saber de nós dois quem é quem depois de tanto tempo, e te conheço bem a ponto de saber que agora me lês com olhar de pura descrença, até com um certo nojo. Sempre me assustei com o teu jeito tão forte, tão sensível a tudo, nada à tua volta não tem teu pleno conhecimento, sentidos múltiplos, só atenção. Eu sou só e quase reação, sempre preferi digerir aos poucos, primeiro o passo, depois a queda, em seguida o tombo, então finalmente a dor, tudo minuciosamente ruminado, quadro a quadro. Me desconcerto a cada impasse e, desastrado, analiso, desgasto, espremo cada impulso, entendo tua repulsa. Também não quero me esparramar em desculpas pra você, dizer que o problema é comigo e fugir safo como um preso solto por bom comportamento. Mas só de olhar já assusto, tantos cabelos, perfumes, bocas, é difícil te dizer isso, por isso escrevo. Não sei se falo demais e sinto de menos ou se é justamente o contrário, esse tempo frio tem a mania de me deixar confuso, mas te peço, por favor: não me faz escolher uma das pontas, não me venha com os teus extremos. Quero antes o meio termo, o morno, a parte maior das chaves, lisa e sinuosa, acidentada e precisa, pequenina e vasta.

6 comentários:

João Francisco disse...

Senti um gosto amargo na boca porque eu poderia ser o sujeito da foto. Em minha defesa digo que radicalismos têm um sex-appeal impressionante, algo que um meio-terno nunca terá.

Afirmações estranhas à parte, estou gostando cada vez mais de percorrer o caminho dos seus textos e ver onde é que esse vereda vai dar.

Beijo!

Alice Sant'Anna disse...

se não foi o preferido, tá no top 5!
beijos

Anônimo disse...

Cons, seus textos sao lindissimos, muito bem escritos..

agora venho sempre aqui, uma delicia..
continue hein..

Beijos!

Ficas disse...

não sei se falas demais e sentes de menos. o que não pode ficar no pouco são teus textos. e o que precisa ficar em nada é a saudade. até amanhã!

L. disse...

Obrigada pelo comentário. Virei sempre aqui também. :)

Anônimo disse...

Constanza, sua sensibilidade ainda me surpreende.

e cheia de pretendentes!
hahahaha
beijos poetisa

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