sexta-feira, agosto 07, 2009

Estufa

Mergulho na incapacidade de lhe nomear: naquele ponto, permanecer, quatro retinas que se encostam, atrapalhado relance. Foi como uma promessa de que as coisas poderiam ser em cores: letreiros, supermercados, poças, sol das sete em fumaça de avenida que já não tomamos mais. Pena. Hoje essa ausência é som estranho de silêncio e relógio, madrugada infinita. Mal me lembro, e a conversa, nem sei, a conversa era desculpa para projetar palavras em sentido ambiente, situação qualquer, minutos a mais, futuro rasgando o presente esquisito. Deixar que se perca a naturalidade, ignorar o entendimento e depois permitir o toque, medo de tudo. As formas se distorcendo em braços e mãos e costas, dobrando esquinas, formando estufa e vedando, pronto, mundo de dois formado, bolha firme. Mas as madrugadas não falam sozinhas, é o que descubro todos os dias. E é o tempo todo que procuro letreiro que me ensine a organizar as coisas, que me entregue seu devido nome, néon qualquer que nos guie de volta para casa, para fora de nós dois.


10/2008

sábado, agosto 01, 2009

Trinta

Mentalizar o amante. Tampar o nariz com os dedos, imergir, água azul nos azulejos: trinta, vinte e nove, vinte e oito, vinte e sete, vinte e seis: mergulhar na sensação de homem/água até que ela esteja por toda a parte do corpo, maiô, boca, orelhas. Por algum acontecimento estranho e místico, virar bicho do mar, parte de tudo, azulejo, cloro, escamas. Escoar até o mar inteiro e ser todos os seus bichos e todos os seus sais. Se for possível respirar por baixo das ondas, transmutar-se em sereia e alagar todo o resto do mundo cuspindo rajadas de espuma. Assim nem todos os oceanos serão pequenos demais. Ser então eternamente possuída por aquele ser, monstro maior de todas as águas ferozes, cabelos enormes que dançam com a fúria das correntes, bocas que se encharcam, tempestade, rodamoinho abissal. Três, dois, um: emergir em anseio de ar, nos ombros sentir derreterem pesados os cabelos, bolhas no nariz. Pára e vê: só o que tens são os azulejos antigos dessa piscina abandonada, metade cheia, metade vazia, água parada, maiô desbotado. Respira, que estás sozinha agora.

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